(fonte da imagem: https://www.quotemaster.org/Roe+V+Wade)
No dia 27 de junho do corrente ano, Anthony Kennedy, Juiz Associado da Suprema Corte dos Estados Unidos da América, prestes a completar 82 anos, anunciou sua aposentadoria após trinta anos em que lá serviu. A Suprema Corte Americana constitui o mais alto tribunal federal daquele país, sendo composta por nove membros.
Assim, abre-se ao presidente Donald Trump a oportunidade de indicar o futuro Juiz Associado.
O leitor pode se perguntar por que a nomeação de um Juiz Associado daquela Suprema Corte pode interessar a nós, brasileiros.
Por primeiro, faz-se mister compreender que a agenda globalista que vai se impondo não apenas em nosso meio, mas em escala mundial, notadamente em matérias que envolvem a família, como união homoafetiva, gênero e aborto teve importante avanço com a chancela da Suprema Corte Americana.
Sendo os Estados Unidos da América o país mais rico e poderoso do mundo, onde, desde 1970 já foram realizados 45,151,389 abortos (https://en.wikipedia.org/wiki/Abortion_statistics_in_the_United_States; acesso em 06/07/2018), não se pode olvidar do impacto que eventual política restritiva a essa prática de assassinato de inocentes causará no mundo.
Há de se ressaltar que pende de julgamento, aqui no Brasil, a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 442 ajuizada pelo PSOL. Com ela, visa-se a ampla liberação da prática abortiva pela via judicial com a exclusão da incidência dos arts. 124 e 126 do Código Penal nos casos de interrupção da gestação induzida e voluntária realizada nas primeiras 12 semanas. A ADPF em questão já foi objeto de artigos anteriores neste periódico, inclusive.
O ano de 1970 é emblemático para os militantes da causa “pró aborto”. Foi nesse ano que Norma L. McCorvey (“Jane Roe“) ajuizou demanda no Condado de Dallas (Texas) pelo direito de abortar sob a alegação de que sua gravidez era resultado de uma violação (estupro), desafiando, assim, a constitucionalidade de uma Lei do Estado do Texas, segundo a qual a prática de aborto era crime, a não ser que ele fosse praticado com o claro propósito de salvaguardar a vida da gestante.
Houve diversos recursos e a demanda chegou à Suprema Corte norte-americana, a qual, em 1973, decidiu que as Leis estaduais sobre aborto, que permitiam a interrupção da gravidez apenas com o intuito de salvar a vida da gestante, eram inconstitucionais, por violação ao disposto na Emenda nº 14 à Constituição norte-americana, assegurando-se o direito da mulher de interromper a gravidez, estabelecendo um critério trimestral para definir o momento em que a gestação poderia ser interrompida.
Em síntese, no caso Roe v. Wade (1973), a Suprema Corte norte-americana reconheceu o direito ao aborto por solicitação da gestante, como consequência do direito à privacidade protegido pela Emenda nº 14 à Constituição norte-americana. Ou seja, o direito ao aborto passou a ser um direito constitucional, um autêntico desdobramento do direito à liberdade individual da mulher de poder dispor a respeito de seu próprio corpo.
Posteriormente, naquele mesmo ano (1973), no caso Doe versus Bolton, referida Corte estendeu a permissão de abortar para qualquer momento da gestação e a consequência catastrófica foi a revogação da maior parte das leis contrárias ao aborto aprovadas em outros Estados.
Interessante ressaltar que “Jane Roe” , na década de 90, abandonou a antiga militância e admitiu ter inventado a história sustentada em seu processo e, em 2003, pediu a reabertura de Roe versus Wade, sem sucesso.
No Brasil, em julgamento ocorrido no dia 29 de novembro de 2016, a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal, com o voto líder do Ministro Luís Roberto Barroso, acompanhado pelos Ministros Edson Fachin e Rosa Weber, nos autos do HC 124.306-RJ, que versava um caso envolvendo funcionários e médicos de uma clínica de aborto em Duque de Caxias (RJ) com prisão preventiva decretada, decidiu descriminalizar o aborto realizado durante o primeiro trimestre de gestação – independentemente do motivo que leve a mulher a interromper a gravidez.
No acórdão em tela, a semelhança da Corte Suprema norte-americana, afirmou-se que a criminalização é incompatível com os seguintes direitos fundamentais: “os direitos sexuais e reprodutivos da mulher, que não pode ser obrigada pelo Estado a manter uma gestação indesejada; a autonomia da mulher, que deve conservar o direito de fazer suas escolhas existenciais; a integridade física e psíquica da gestante, que é quem sofre, no seu corpo e no seu psiquismo, os efeitos da gravidez; e a igualdade da mulher, já que homens não engravidam e, portanto, a equiparação plena de gênero depende de se respeitar a vontade da mulher nessa matéria”.
Em que pese o Juiz Associado Anthony Kennedy ter sido nomeado apenas em 18 de fevereiro de 1988 pelo Presidente Ronald Regan , fato é que numa Corte polarizada como a norte-americana, o Juiz, de perfil moderado, vinha sendo o voto de minerva, tendo participação decisiva na preservação do precedente do caso Roe v. Wade.
Com a sua aposentadoria e a promessa eleitoral do Presidente Donald Trump de nomear um juiz “pró-vida”, como parece ter feito ao indicar o Juiz Federal da Corte de Apelações em Washington, Brett M. Kavanaugh, 53 anos, católico, temem os ativistas pró-aborto que a nova configuração da Suprema Corte passe a defender novas restrições ao que chamam “direito constitucional das mulheres ao aborto legal”. A ONG norte-americana Planned Parenthood já traz em sua página oficial “Protect Abortion at Supreme Court” – Send your senators a message now” (https://www.plannedparenthood.org/ acesso em 10/07/2018). Ou seja, já estão conclamando os abortistas a lutar pela preservação do aborto na Suprema Corte, concitando-os a pressionar seus senadores (como no Brasil o indicado deve ser referendado pelo Senado).
O indicado, de perfil conservador, tem uma única incursão na arena do aborto, em caso que envolvia uma menor estrangeira grávida e não-acompanhada, sob custódia do Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos Estados Unidos. Na ocasião, Kavanaugh posicionou-se aparentemente contra o direito ao aborto ao criticar a atuação de seus pares que, segundo ele, inventaram “um princípio constitucional tão novo quanto errado: um novo direito para menores imigrantes ilegais detidos pelo Governo dos EUA de obter aborto imediato via pleito individual.” (https://www.nationalreview.com/bench-memos/brett-kavanaugh-trump-supreme-court-nominee/) Ele mesmo não se posicionou, de forma clara, contrariamente ao decidido no precedente de Woe v. Rade (daí ser impossível, por enquanto, ter alguma certeza sobre o que ele fará na Suprema Corte quanto a isso). O que ele fez foi prolatar decisão que, se seguida fosse, acabaria por impedir que a menor em questão praticasse o aborto uma vez que ela, quando efetivamente pudesse fazê-lo, já estaria com 18 semanas de gravidez.
Em razão da forte influência americana e do grande apoio financeiro que entidades como a Planned Parenthood dá a campanhas pró-aborto em todo o mundo, a prevalecer o cenário traçado por esses grupos, haverá um contra-ataque à matança dos inocentes, que poderá vir a influenciar outras nações.
Isso se dará num momento crucial para nós brasileiros em razão do julgamento da mencionada ADPF 442 que, caso julgada procedente, traduzirá a vitória traçada por aqueles que enxergam no Poder Judiciário o meio adequado para implementar agendas que vão de encontro ao anseio da maioria da população e que atendem a uma agenda globalista pronta a desmoronar com os pilares basilares da civilização ocidental.
O que está por trás desta manobra é a usurpação de poder que vem se impondo, deslocando propositalmente o locus da discussão das casas legislativas para o âmbito do Poder Judiciário, onde, em razão do ativismo judicial, sob a falaciosa alegação de omissão do poder legislativo, o aborto, agora sobre a novel roupagem de “direito humano” de poder a mulher dispor de seu corpo ao seu bel prazer, parece se sobrepor ao direito a vida dos inocentes.